domingo, novembro 09, 2014

Areal, estacionamento?

(Artigo publicado no jornal Cardeal Saraiva de 06 de Novembro de 2014)

Não sei se o leitor aprecia, mas um dos meus divertimentos é “passear” pelos livros e fotografias antigas. Num desses “passeios”, encontrei uma fotografia interessante. O seu interesse passava pelo cenário retratado e por quem era retratado. Um grupo de jovens, aí na casa dos seus 20 anos, algures na década de 30 do século XX, escolhia o areal fronteiro à vila de Ponte de Lima para ser retratado. A fotografia que contemplo foi entregue com uma dedicatória de amizade.

O areal de Ponte de Lima sempre foi olhado com orgulho pelos limianos, como identitário, como elemento diferenciador de outras localidades. Usado para vários fins, desde corar e secar roupa até receber uma das maiores feiras quinzenais do país.

Com o passar dos anos e a massificação do automóvel, aquele espaço passou a ser a alternativa de estacionamento para quem não encontrava um lugar dentro do centro histórico. Paulatinamente, o areal foi sendo ocupado, em toda a sua extensão, pelo automóvel tornando-se este estacionamento, ironia das ironias, um ponto de atratividade para a vila limiana. Então, não seria de aproveitar a possibilidade de estacionar gratuitamente bem perto do centro histórico?

A verdade é que esta realidade foi sendo acentuada pela política da Câmara Municipal de proibir o estacionamento dentro do casco histórico. O núcleo do centro histórico foi passado, em exclusivo, para os peões e as ruas que o circunscrevem, foram, progressivamente, libertadas do estacionamento automóvel (marginal, largo de Camões…).

Se, por um lado, o centro histórico deixou de ter nas suas ruas o automóvel, a verdade é que a pressão passou toda para o areal. Os parques de estacionamento subterrâneos do centro histórico, que entretanto foram criados, foram pensados para estacionamentos específicos Embora tendo sido apresentados como alternativas ao estacionamento no areal, na verdade, nunca o foram. Um foi ocupado pelas viaturas de funcionários da própria câmara, o outro, no mercado municipal, manteve-se, na maioria do tempo, fechado, não atraindo público.

Com o passar dos anos, o areal deixou de o ser. A areia deu lugar à terra e à erva (com sistema de rega colocado pela Câmara Municipal). A roupa a secar desapareceu e os automóveis passaram a reinar. Nestes últimos anos, para além dos automóveis, o areal passou a receber as autocaravanas e os autocarros. As excursões começaram a parar bem junto à ponte medieval e esta passou a ser um género de sombreiro para os bancos de plástico e lancheiras.

Temos assim um problema, caro leitor. Hoje, quem escolheria o areal par tirar uma fotografia em grupo para oferecer aos amigos ou à namorada? Infelizmente, muitos ainda não veem o problema ambiental, turístico, económico e social desta ocupação selvagem. Infelizmente, muitos desses ocupam lugares de decisão.

Para resolver este problema devem ser dados pequenos, mas decisivos passos. Por exemplo, na última reunião da Assembleia Municipal foi sugerida a proibição do aparcamento dos autocarros no areal, salvaguardando-se a permissão do desembarque junto ao centro histórico. O presidente, numa primeira abordagem, e como vem sendo hábito, preferiu generalizar e defender-se, anunciando mais um ataque do PSD ao comércio tradicional por estar a propor a proibição do estacionamento no areal. Confrontado com a necessidade de responder ao que estava, de facto, a ser sugerido, o presidente da Câmara, afirmou “não vejo qualquer inconveniente no estacionamento dos autocarros no areal”.

Infelizmente, caro leitor, é com este tipo de pensamento que nos confrontamos. Infelizmente, caro leitor, os nossos responsáveis ou não encontram fotografias, como a descrita no início do texto, para ficarem sensíveis ao problema, ou nunca entenderam a beleza e importância do areal do rio Lima, ou, simplesmente, olham para o lado acreditando que, se ninguém falar, ninguém reparará no problema…  

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