domingo, novembro 23, 2025

Alto Minho, artigo de 20-11-2025

 É difícil 

Tive a sorte de crescer num ambiente politizado. Decorriam os anos 70, 80 e 90 do século passado. À minha volta, várias pessoas tinham participação política activa, nos partidos e nas associações, como eleitos autárquicos ou membros de outros órgãos locais e nacionais. Tive sempre contacto com a responsabilidade que é a representação dos concidadãos, e, talvez também por sorte, todos os meus próximos com essas responsabilidades foram bons exemplos no exercício dos seus deveres. Não tive dificuldades em aceder à informação, tive acesso a livros, sempre com a consciência de que, se não os tivesse em casa, encontrá-los-ia na biblioteca municipal. Os bons exemplos e a informação estiveram sempre, mesmo sem Internet, ao meu alcance. Desse crescimento resultou a minha perspectiva da política como um imperativo cívico, um serviço à comunidade, com balizas éticas bem definidas.

Confesso que é difícil perceber a justificação para as pessoas, que cresceram no mesmo tempo e mesmo espaço geográfico, com as mesmas possibilidades, não terem a mesma visão do que é serviço, do que é eticamente aceitável, do que é estar ao serviço da sua comunidade. É por isso que não consigo tolerar os que colocam à frente dos seus concidadãos, naquilo que deveria ser o exercício do serviço publico, os seus interesses privados, a “vã gloria de mandar”, o seu orgulho ou sei lá mais o quê. 

 

A saga continua


Pela vila de Arcozelo, os episódios rocambolescos da eleição dos vogais da Junta de Freguesia adensam-se. Saídos de uma eleição, onde os eleitores deram a vitória a uma lista, mas repartiram os mandatos por forma a que nenhuma força tivesse a maioria absoluta, depois dos esforços de toda a oposição para que existisse um consenso entre todas as forças políticas para a governação estável da freguesia, o presidente eleito optou por colocar o seu ego à frente dos interesses coletivos. De reunião em reunião, foi “arranjando” subterfúgios como tentar forçar a eleição dos nomes por si propostos, com interpretações estapafúrdias dos votos contra da maioria dos eleitos, ou suspensões abruptas de reuniões, para impedir o normal funcionamento dos órgãos autárquicos. Chegou-se a um ponto em que os membros da Assembleia de Freguesia, 60% dos membros eleitos, tiveram de se ausentar da reunião, deixando de existir quorum, porque lhes queriam impor uma forma de votar que não permitia a opção de votar contra.  

Ao não querer aderir a um entendimento alargado entre as forças presentes na assembleia, o presidente eleito provocou um impasse. Resta-lhe as seguintes saídas políticas. Percebe que, em democracia, nem sempre o que queremos é o que obtemos da maioria e aceita o proposto pela oposição, de governo tripartido liderado, obviamente, por ele. Renuncia ao mandato e permite o segundo da sua lista desbloquear o processo. Fica em gestão corrente, limitadíssimo na acção, prejudicando e bloqueando a freguesia. Ou, como não quer consensos, inicia o processo conducente a eleições intercalares e deixa os eleitores decidirem. Há só uma pessoa com capacidade para decidir o passo seguinte, consequentemente o único responsável e culpado dos resultados dessa decisão, o presidente eleito. 

Obviamente que o ideal, para a vila de Arcozelo, era a adesão do presidente eleito ao consenso alargado proposto pela oposição. Não o querendo e porque ceder o lugar ao seu segundo será opção fora de equação, entre ficar em gestão corrente ou eleições intercalares, não restam dúvidas de que o caminho para a repetição de eleições é o melhor para a freguesia. Entra, assim, em jogo um novo “player”, a Câmara Municipal e a sua capacidade de influência. Se houve um vencedor em Arcozelo, foi Vasco Ferraz. Obteve cerca de mais 12% de votos que a lista mais votada para a Assembleia de Freguesia. Provavelmente foi aqui que conseguiu eleger mais um vereador, é também por isso que tem uma responsabilidade acrescida para que o processo autárquico da maior freguesia do concelho desbloqueie. Na actual situação, não haverá nada melhor do que pedir aos arcozelenses para desfazerem o nó entretanto criado.